domingo, 16 de agosto de 2009

novos tempos



Anos atrás a prova de conclusão de um curso de desenho que eu fiz consistia em fazer uma releitura de uma obra de arte bastante conhecida, de forma que o publico reconhecesse imediatamente a obra mãe.
Este aí de cima foi o meu trabalho, porque as mulheres já não andavam mais lendo da mesma forma que na época de Renoir.

Tudo isso me leva a rever os tempos em que vivi. Me considero privilegiada de ter presenciado nesta vida as mudanças mais completas e rápidas por que a humanidade passou. Os últimos 60 anos viram a criação de um mundo completamente diferente e a história se acelerou a um ponto em que a cada 5 anos já existe um novo mundo, uma nova sociedade a ser registrada. Uma pessoa que não saiba usar um computador e a internet é a analfabeta de hoje. Profissões deixaram de existir, e outras novas aparecem como pipocas.

Quem viveu em 1850 já tinha a possibilidade de ouvir num gramophone a gravação de uma grande orquestra, ou um grande virtuose, de forma que as grandes performances deixaram de ser efêmeras. Como teria sido poder ouvir o próprio Paganini, o próprio Liszt, o próprio Mozart interpretando sua obras mestras????
Quem viveu em 1900 já podia receber comunicação de longas distâncias pelo rádio e pode conhecer a Luz elétrica.
Quem viveu em 1950 já podia usar o telefone, a fotografia, o radar, os telegramas, os aviões.

Eu nasci em 1960, já havia televisão, transmissão direta ao vivo, programas gravados em fitas, apenas 10 anos depois de 1950.
Cara, eu assiti AO VIVO ao homem pisando na Lua!
Daí em diante a cada poucos anos uma nova tecnologia surgiu e afetou a humanidade em geral, até chegar onde estamos hoje, que será menos "acelerado" do que onde estaremos em 2015.

Eu carrego hoje, num pendrive que tem 6 cm de tamanho, o equivalente ao acervo da Biblioteca de Alexandria, 1200 textos antigos sobre Alquimia, Filosofia, Metafísica, História, Arte, Geometria Sagrada, Hermetismo, Kabbalah, escritos dos filósofos gregos, dos grandes humanistas e obras de escritores clássicos, muitas vertentes do pensamento humano... em segundos, com o auxílio de um pequeno aparelho, sem sair do conforto da minha casa, eu tenho acesso à sabedoria e escritos de grandes mentes de todo um passado registrado da humanidade.
Isso faz de mim uma pessoa mais sábia do que eles?
Isso faz de mim uma pessoa com mais responsabilidade do que eles carregaram?
Isso faz o meu mundo melhor do que o deles?


Infelizmente o homem não passou por um upgrade juntamente com a tecnologia, um sábio ainda vai precisar ler e meditar sobre toda essa informação que acumulou, ainda vai precisar gastar longos anos de estudo para conseguir extrair de todo este material algo novo, algo importante, algo que signifique um pequeno passo adiante no pensamento e filosofia que definem o que é ser um membro da humanidade, um Homem Humanista.

Existe um defasagem de tempo entre a aceleração da história e o tempo necessário para a compreensão do conteúdo de todo conhecimento da humanidade ... serão possíveis de se concicliar estes dois?

Às vezes fico imaginando que a posição de Leonardo da Vinci como um mestre de todas as áreas de conhecimento do seu tempo hoje seria impossível, basta constatar que TUDO o que se sabia na época dele era menos do que um estudante regular do segundo grau tem que saber hoje para passar num vestibular decente.

A diferença de velocidade do avanço da tecnologia em relação ao pouco tempo de duração da vida de um homem para a compreensão do conteúdo de conhecimento da humanidade pode nos levar de volta à uma Idade da Treva, porque a informação circula sem filtros, sem bases e pre requisitos, e as pessoas já a estão usando de forma supersticiosa ou simplista... Daqui a pouco estaremos dizendo " é assim porque algum fisico quantico disse", ou " acredito nisso porque foi publicado na revista tal"... ninguem mais vai conferir as fontes, as bases do pensamento antes de assumi-lo como verídico e válido, ninguem mais tem bases para comparação e análise. Os estudantes copiam seus trabalhos escolares da internet sem ter a menor noção da validade das fontes que estão usando.

Vão surgir escritores que nunca tiveram tempo para ler todos os clássicos e todos os grandes escritores que os precederam, a vida moderna não permite às pessoas muito tempo para si mesmas, para leitura, estudo particular, o tempo é raro e precisa ser usado na formação e desempenho profissionais... no final das contas vivemos apenas para continuar vivendo, para continuar cumprindo metas e tarefas cuja única finalidade é a manutenção do sistema em si, estamos vivendo anestesiados na Matrix, apenas para sustentar a máquina.

Vão surgir especialistas, que precisam de tanto tempo para se aprofundar num único assunto que não poderão se instruir em outras áreas humanas de conhecimento,no afã de conhecer o minúsculo grão eles nunca verão uma tempestade de areia moldar uma rocha sólida.

Médicos estudam tantos anos para enxergar completamente um pequena parte do seu corpo, e mesmo que quisessem nunca teriam tempo suficiente nas suas vidas para dominar o funcionamento do corpo inteiro.

Estudiosos que passarão suas vidas catalogando TUDO no mundo humano como sendo apenas reflexo de uma única forma de visão, os psicólogos psicologizam tudo, os cientistas avaliam tudo cientificamente, criando mundos estanques de economistas, advogados, tecnicos, e assim por diante, pequenas ilhas de raciocinio e avaliação norteadas por uma única forma de ver as coisas.

Mas a Humanidade e o Humanismo sobreviveram a tantas coisas, durante tanto tempo, que em algum lugar, em alguma caverna, um eremita vai se resguardar deste mundo moderno, estudar e proteger os conhecimentos antigos, para que no final desta nova idade acelerada e superficial os homens retomem o desenvolvimento em uma velocidade que lhes permita de novo crescer, evoluir e melhorar junto e a favor da Humanidade e do Humanismo.

Um comentário:

  1. Concordo em grande parte com seu pensamento. Estamos perdendo a visão do todo. A segmentação facilita aprofundar os estudos mas pode tirar o foco do principal. Vivemos a era da cultura de orelha de livro, da pessoa que escutou o galo cantar mas não sabe onde, das pessoas que contam estórias de outras pessoas pois não tem tempo de fazer sua própria história.

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